sexta-feira, 29 de outubro de 2010

A melhor Receita!

Já experimentou fazer um bolo naqueles dias de desconsertos? Naqueles momentos do tipo: 'Quem sou eu'? Ou 'O que vim fazer nesse mundo'? Pois saibam, faz milagres...
Ando assim por estes dias. E não me acho anormal. Temos, eu, você e Deus, dias de fúria, de descontentamento descontente. Mas, ali deitadinha na cama olhando pro teto, pensei: Vou terminar de ler meu livro, Lya Luft: 'Multipla Escolha' sensacional, maravilhoso, bárbaro, feito a Lya. Mas, veio de repente uma vontade súbita, antes do livro, de fazer um bolo, de cenoura com cobertura de chocolate com canela.

Assim mesmo tudo na letra 'C'. Cenoura, chocolate, cobertura e canela. Ah! Pode ser Café ou Chá para acompanhar. (risos).
Fui para cozinha ver se tinha todos os ingredientes. Só faltava a canela. Saí ali rapidinho para comprar. No caminho de volta dessa compra 'enorme', encontrei um amigo que se separou recentemente. Me abordou e falou-me das mazelas que estava passando. Parei e ouvi com atenção, ele é uma pessoa que acho muito querida, muito 'família' e que a mulher o havia trocado por um rapaz mais jovem. Eu já sabia dessa história, mas tive que fazer aquela cara de surpresa, acho isso um terror. Coisas de adultos que as crianças nunca deveriam aprender. Enfim, conversamos uns quinze minutinnhos e o deixei falar, desabafar, terminei o papo com uma frase super 'batida' "As coisas são assim mesmo" e ele com outra mais 'batida' ainda: "É mesmo, fazer o quê?' - Voltei pra casa. E ele, não sei.

Na minha cabeça a receita do bolo já ficou emocionalmente abalada. Sou sensível aos problemas dos outros. Coisa de pisciana nascida no primeiro dia do mês de março, só pode. Mas, confiante de que fazendo um bolo eu estaria salva de um domingo sem sal, sem açucar, sem canela... Não desisti!
Coloquei todos os ingredientes na bancada da cozinha e fui começando a receita. E sabe de quem me lembrei? Da Ofélia, aquela mesma, da cozinha maravilhosa. Pensei... Ela vai estar presente aqui comigo em memória, me auxiliando num tipo de bolo que nunca fiz. E olha, que já fiz muitos na vida. Tudo pronto, tudo na ordem crescente das coisas e a minha cigarra toca. Era a minha tia-avó, Rosa. Veio me deixar o convite de sua formatura, que aos 61 anos estava na maior alegria concluindo o curso de sociologia. Chegou e veio pra cozinha, sentou-se numa cadeira e me trouxe um universo tão fora de moda, mas tão interessante, que somente com meus 39 anos é que posso ouvir e entender. Pois sim, ela começou a me lembrar do dia em que eu nasci. Ela era a única que estava perto da minha mãe no dia. E descascando cenoura, ouvi um pouco da minha vinda ao mundo. E logo hoje que eu me perguntava: "O que vim fazer nesse mundo"? Que coisa...
Meu bolo, nota-se já carregado de sentimentos. Toda família no shopping, e eu com tia Rosa, tentando fazer uma simples receita com de cenoura, chocolate e canela. Inusitado e caseiro.

Finalmente, pra resumir meu domingo, o bolo ficou pronto. Ficou lindo, fofo, cobertura brilhando. E a canela que faltava, foi o ingrediente que menos usei, mas o que me deixou mais confiante e refletindo de que na vida todos temos nossos momentos de 'trevas', ou de muitas perguntas sem respostas. Meu amigo na padaria, minha tia Rosa sentada na cadeira da cozinha, o silêncio da casa depois e o cheirinho de bolo que invadiu toda minha tristeza. Crescer, somente o bolo. Minha falta de alegria, não. E jamais desistir de tentar se firmar num momento feliz.