
A moderna Biblioteca Virgílio Barca, em Bogotá/Colômbia

A sofrida Biblioteca Câmara Cascudo, em Natal/RN - Foto: Rodrigo Sena - Tribuna do Norte
Em agosto de 2010 tive a oportunidade de integrar uma comitiva composta por 50 educadores brasileiros que, durante uma semana, participou de um intercâmbio cultural em Bogotá/Colômbia, conhecida como a “Capital Mundial das Bibliotecas”. Além de mim, viajaram dez professoras de escolas públicas estaduais de Natal e Parnamirim, representantes dos cinco projetos de leitura vencedores do Concurso Escola de Leitores, promovido pelo Instituto C&A, em parceria, no Estado potiguar, com o Instituto de Desenvolvimento da Educação (IDE) e a Secretaria de Estado da Educação e da Cultura (SEEC).
A experiência de visitar bibliotecas esplendorosas, participar de seminá rios com renomados especialistas nas áreas de Educação e Leitura, conversas com escritores, bibliotecários e educadores, rendeu incontáveis aprendizados e reforçou pelo menos uma certeza: biblioteca não é luxo, mas sim um equipamento de fundamental importância para garantirmos o direito de toda população ao acesso à cultura escrita. Diante dessa assertiva, cabem algumas indagações: por que será que negligenciamos nos cuidados com as poucas bibliotecas públicas que temos? Por que não espalhamos bibliotecas pelos bairros distantes do centro? Por que será que há tantas escolas sem bibliotecas, sem bons acervos e sem professores que promovam a leitura? Por que secundarizamos o papel da biblioteca escolar, mesmo sabendo que a maioria dos alunos e suas famílias têm limitadas chances de serem consumidores em livrarias e sebos?Convém refletirmos sobre os baixos indicadores educacionais do nosso Estado, agravados, certamente, pelo déficit de bibliot ecas e de projetos sistemáticos de promoção da leitura e escrita. É lamentável verificarmos que quase a totalidade das bibliotecas públicas apresenta infraestrutura obsoleta e reduzidas propostas de formação de leitores. Nas escolas, quando existem, são comuns as carências de acervo e/ou de profissionais qualificados para fazerem a gestão do espaço e a mediação de leitura. Não é por acaso que o poder público, a partir de meados de 2007, em parceria com o IDE e o Instituto C&A, tem protagonizado iniciativas, tendo em vista a sua Política de Promoção da Leitura Literária nas Escolas. Trata-se de um movimento que não comporta retrocessos, justamente pelo fomento à construção da Rede Potiguar de Escolas Leitoras, tecida a partir do comprometimento das unidades de ensino.
A Rede Potiguar de Escolas Leitoras já alcança 145 escolas públicas estaduais e municipais de Natal e Parnamirim/RN, organizadas em quinze polos de leitura. Com a expa nsão, pela SEEC, para 42 escolas do município de Mossoró a expectativa é de que a rede logo se espalhe pela região oeste do Estado. Desde o início, a formação de educadores mediadores de leitura e gestores de projetos de formação de leitores é a principal ação do projeto da Rede, além da dimensão da incidência política e do controle social, haja vista a legislação federal (Lei 12.244/10); a estadual (Lei 9.169/09) e a do município de Natal (Lei 6.094/10).
Defendemos políticas públicas de promoção da leitura, por entender o ato de ler como prática social e, ao mesmo tempo, ato dialógico pessoal. Ao ler, o leitor produz sentidos e, amalgamado pelo contexto em que vive, pela sua história e experiências anteriores, constrói a realidade a partir da relação com o texto. Isso posto, embora se configure como tarefa das mais desafiadoras, temos a clara intenção de mediar um processo capaz de contribuir para o desenvolvimento do gosto pela leitura e de ajudar a formar leitores críticos, como destaca Ezequiel Theodoro da Silva, em publicação do Instituto C&A de apoio ao programa Prazer em Ler (2006): “As teorias clássicas na área de leitura explicitam três posturas distintas para o leitor na sua interação com os textos: o ler as linhas, o ler nas entrelinhas e o ler para além das linhas.” Jean Foucambert, no livro “A leitura em questão”, contribui com essa discussão, quando diz que leitor “não é quem lê o livro que lhe é proposto, mas aquele que cria os seus próprios meios para encontrar e diversificar os textos ligados aos seus interesses.” Leitora, ex-aluna da Escola Estadual Hegésippo Reis, aos 11 anos Ana Beatriz fez uma declaração que bem ilustra as palavras de Foucambert: “Quando a professora pede para eu ler um livro, eu me comporto como aluna e quando eu leio o que eu quero, me comporto como eu mesma.” Ana Beatriz explicita a autonomia de leitora que se constrói na frequência as sídua à sala de leitura da escola. Evidencia os efeitos de um projeto que, efetivamente, forma leitores. Para ela e tantos outros, bibliotecas bem cuidadas, com acervo e professores mediadores não são luxo, mas sim uma necessidade.
Cláudia Santa Rosa é educadora, escreve a convite do Instituto de Desenvolvimento da Educação (IDE), que publica artigos no jornal Diário de Natal às sextas-feiras.